Introdução:
Muitas pessoas acham que o sigilo total é a regra, mas na verdade esse não é o melhor e nem mais eficaz caminho. A transparência é o alicerce para uma investigação corporativa eficaz e confiável.
Quando uma empresa decide terceirizar o processo investigativo para uma consultoria externa, surgem alguns desafios que precisam ser cuidadosamente geridos, como por exemplo, assegurar, com clareza, que todos os envolvidos se sintam informados e respeitados, sem comprometer dados sensíveis ou a integridade da investigação. Como tudo na vida, o equilíbrio é fundamental: há partes da investigação que precisam ser mantidas em sigilo por um período para o bom andamento do processo, por outro lado, há outras que devem ser totalmente transparentes. Essa transparência é necessária por diversos fatores: exigência regulatória, questão contratual, ética investigativa, LGPD…
Neste artigo, compartilho alguns insights que ajudam a encontrar esse equilíbrio, garantindo que a transparência se mantenha alinhada à ética e às exigências legais.
1. Transparência como valor e necessidade
Ser transparente nas investigações é, além de um valor corporativo, a demonstração prática de que a empresa adota práticas justas e está comprometida com a verdade. Não há espaço para suspeitas ou dúvidas.
Essa postura reforça a imagem de uma empresa íntegra e demonstra um respeito genuíno por todos os envolvidos e para a sociedade.
2. Definindo papéis com clareza
Um fator essencial para a uma transparência eficiente quando da contratação de uma consultoria externa para investigação é definir o papel de cada um, os limites de sua atuação e o apoio que a empresa contratante vai fornecer.
As funções, limites, atividades e tudo o que interessa para uma boa investigação devem ficar muito bem distribuídas.
- Empresa contratante: Normalmente é responsável pela comunicação pública e pelos feedbacks ao denunciante, salvo outra definição contratual, além de repassar à consultoria todo tipo de informação que seja solicitada.
- Consultoria: A consultoria precisa agir de forma independente, zelando para que informações sensíveis fiquem em mãos restritas. Isso é especialmente importante para denúncias anônimas, porque o denunciante precisa ter a certeza de que sua identidade e os detalhes serão protegidos.
3. Informações reservadas e preservação da investigação
Uma investigação transparente não significa expor todos os detalhes, pelo contrário…
Algumas informações precisam ser mantidas reservadas para garantir que o processo investigativo siga sem interferências e que todas as partes envolvidas sejam protegidas. “Ah, mas isso também vale par a pessoa investigada?” – Sim, vale. Primeiro que é um direito fundamental de qualquer pessoa não se ver exposta a nenhum tipo de constrangimento ou suspeição antes de ser considerada culpada; e segundo que uma boa investigação não investiga pessoas, mas sim fatos e essa investigação vai investigar até o ponto de poder responder as perguntas do 5W2H ou 5W1H, a depender do tipo de caso investigado.
Resguardar esses dados permite à consultoria atuar de forma estratégica, sem deixar os envolvidos saberem de seus próximos passos e, com isso, se desfazerem de evidências que podem ser cruciais para a resolução da questão. Isso ajuda a evitar a exposição de detalhes que poderiam prejudicar o andamento dos trabalhos.
4. Comunicação regular e respeitosa com o denunciante
O feedback para o denunciante é um ponto essencial. Sempre que possível, a empresa deve fornecer atualizações do processo, mesmo que seja uma denúncia anônima.
Isso mostra ao denunciante que ele foi ouvido e que a empresa valoriza seu papel. Esse cuidado constrói uma confiança que incentiva novas denúncias quando necessário e estabelece um canal de comunicação ético e respeitoso.
5. Obediência à LGPD: segurança e respeito aos dados
A conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados, a nossa LGPD, é condição obrigatória e que traz responsabilidade extra à investigação e à transparência.
Na prática, significa que todos os dados pessoais coletados precisam ser tratados com extremo cuidado e protegidos de maneira adequada. A consultoria deve assegurar que qualquer dado sensível seja acessado e processado somente conforme previsto em contrato e legislação e somente pelas pessoas que realmente necessitem ter acesso a esse tipo de informação.
Não, a LGPD não é mera lei escrita que não será aplicada a esses casos. Essa importante lei protege direitos fundamentais, protege pessoas, protege patrimônios e, em alguns casos, pode proteger vidas – e não estou me referindo apenas à vida física, mas também a emocional e reputacional.
Esse cuidado extra evita problemas legais, multas e reputação, além de reforçar a confiança dos envolvidos.
6. Independência e confidencialidade: os alicerces da transparência
A independência da consultoria é a base para que a investigação seja imparcial.
Todos os dados sensíveis devem permanecer restritos aos profissionais envolvidos diretamente na investigação. Isso reforça a legitimidade do processo e tranquiliza aqueles que se preocupam com o sigilo das informações e com a autonomia da consultoria contratada.
7. Tecnologia como aliada para transparência e sigilo
Há diversas ferramentas que automatizam a comunicação entre a equipe investigativa e os stakeholders. Assim é possível manter todos atualizados e com acesso a dados relevantes sem comprometer a confidencialidade.
Isso reduz a necessidade de comunicações manuais, garante que a informação chegue sempre de forma segura e padronizada e mais, quando bem desenhada, permite-se descobrir até mesmo de onde partiu eventual vazamento de informações.
8. Alinhamento com a cultura corporativa
Todo processo investigativo deve ser uma extensão dos valores de compliance e governança da empresa e da consultoria. É importantíssimo que esses valores sejam comuns porque se não o forem uma relação que poderia ser harmoniosa entre cliente e consultoria vai se tornar conflituosa. Não existem valores bons ou ruins, mas existem os diferentes e o de um deve se alinhar e complementar o do outro.
É fundamental que cada etapa reflita esses valores, desde o planejamento da investigação, passando pelo cumprimento dos processos para a busca pela verdade até o relatório que a encerra.
Dessa forma, a investigação demonstra o compromisso da empresa com a ética e fortalece sua posição de transparência e integridade.
Conclusão:
Ao estabelecer processos claros e bem distribuídos, manter informações reservadas e agir em conformidade com a LGPD, é possível conduzir uma investigação transparente, justa e eficiente. A clareza nos papéis e o compromisso com a ética reforçam a confiança dos stakeholders e constroem uma cultura de integridade e responsabilidade.
Esse é o caminho para investigações que protegem a empresa, seus stakeholders e a sociedade que a acompanha.