Em qualquer processo investigativo, especialmente no ambiente corporativo, há uma linha tênue entre a eficiência técnica e a integridade ética. É uma percepção que carrego desde os tempos em que conduzia investigações criminais e que se reforça hoje enquanto especialista em compliance, investigador corporativo e advogado de defesa e investigador defensivo. Métodos e ferramentas são importantes para a execução de uma boa investigação, mas a sustentação ética e jurídica, que garante sua legitimidade e eficácia, é encontrada nos princípios.
Sempre se fala em princípios, mas, afinal, o que realmente são princípios? Por que eles são tão fundamentais no contexto de investigações corporativas?
O que são princípios?
Princípios são os fundamentos éticos, normativos e conceituais que orientam a tomada de decisões e a execução de atividades. Diferente das regras ou procedimentos, que ensinam “como” fazer”, os princípios respondem ao “por quê”. Assim, eles transcendem às regras específicas e procedimentos técnicos. Funcionam como guias universais que asseguram ética, coerência, moralidade e legitimidade nas atividades.
Nas investigações corporativas, os princípios norteiam o comportamento dos envolvidos e estabelecem os parâmetros para avaliar se a investigação foi conduzida de forma justa, ética e eficaz. Sem princípios claros, corre-se o risco de que métodos sejam aplicados de maneira arbitrária ou que os resultados sejam comprometidos por interesses externos.
Investigações guiadas por princípios sólidos protegem a organização, os indivíduos envolvidos e até mesmo os investigadores. Os princípios promovem a ética, a confiança, a justiça e o aprendizado organizacional.
Abaixo, exploramos os dez princípios essenciais que fundamentam uma investigação corporativa eficiente.
1. Integridade
A integridade é o pilar central de uma investigação eficiente. Significa conduzir o processo de maneira ética, sem manipular fatos, ocultar evidências ou fabricar conclusões. Um processo investigativo íntegro busca a verdade, independentemente de pressões internas ou externas.
Na prática:
- Jamais sacrificar a ética em nome da conveniência ou do benefício organizacional.
- Garantir que todos os envolvidos compreendam e sigam padrões de conduta claros.
2. Imparcialidade
A imparcialidade exige que a investigação seja realizada sem preconceitos ou interesses diversos da busca pela verdade. Os investigadores devem estar livres de qualquer influência que possa distorcer a análise dos fatos.
Na prática:
- Selecionar equipes isentas de conflitos de interesse.
- Evitar pré-julgamentos, mantendo um olhar objetivo sobre as evidências.
3. Confidencialidade
Manter o sigilo é crucial. Informações vazadas podem comprometer a investigação, causar danos irreparáveis à reputação da empresa, aos investigadores e, muitas vezes, à vida das pessoas envolvidas.
Na prática:
- Controlar rigorosamente o acesso às informações.
- Firmar compromissos de sigilo com todos os envolvidos.
4. Legalidade
A investigação deve respeitar as leis locais. Métodos ilegais, como invasão de privacidade ou obtenção de provas de forma ilícita, ou antiéticos podem invalidar os resultados e expor a empresa a riscos legais.
Na prática:
- Consultar especialistas legais para garantir conformidade.
- Revisar periodicamente os procedimentos à luz de alterações legislativas.
5. Transparência
Embora a confidencialidade seja crucial, é igualmente importante que as conclusões da investigação sejam apresentadas de forma clara e fundamentada. A transparência fortalece a confiança da alta administração e das partes interessadas. Confidencialidade não é sinônimo de obscuridade.
Na prática:
- Elaborar relatórios objetivos e acessíveis.
- Informar partes interessadas sobre progressos relevantes, sem comprometer o sigilo.
6. Objetividade
A objetividade assegura que as conclusões sejam baseadas apenas em fatos verificáveis, e somente em fatos. Não há espaço para interpretações subjetivas ou emocionais. A análise deve ser rigorosa e metodologicamente sólida.
Na prática:
- Utilizar dados e evidências para fundamentar decisões.
- Não fazer interpretações que extrapolem o que as provas permitem afirmar.
7. Proporcionalidade
As ações durante a investigação devem ser proporcionais à gravidade dos fatos. Isso significa evitar medidas desnecessárias ou excessivas que possam prejudicar os direitos das pessoas ou gerar custos desproporcionais à organização.
Na prática:
- Avaliar continuamente o impacto das ações investigativas.
- Ajustar o escopo da investigação conforme novos fatos surjam.
8. Celeridade
Tempo é um recurso valioso em qualquer investigação. A demora pode comprometer a qualidade das provas, ampliar os danos à empresa e afetar a confiança dos envolvidos. Celeridade não é sinônimo de pressa: é agir com eficiência e responsabilidade, porém não se sacrifica a qualidade em favor da celeridade. A celeridade faz parte da qualidade.
Na prática:
- Estabelecer prazos realistas e monitorá-los rigorosamente.
- Priorizar ações com maior impacto para acelerar a solução.
9. Prevenção e Aprendizado
Uma investigação não termina com o relatório final. Ela deve servir como base para a prevenção de problemas futuros e o fortalecimento da governança organizacional.
Na prática:
- Identificar vulnerabilidades sistêmicas e recomendar melhorias.
- Transformar lições aprendidas em políticas e treinamentos.
10. Responsabilidade
A responsabilidade, ou accountability, é essencial para garantir que a investigação seja conduzida de forma responsável. Isso significa que todas as decisões, métodos e resultados precisam ser bem documentados e que os envolvidos estejam prontos para prestar contas.
Na prática:
- Registrar todas as etapas da investigação e atentar à cadeia de custódia.
- Estar preparado para responder a questionamentos internos ou externos.
Concluindo…
Os princípios de uma investigação corporativa eficiente não são meras abstrações. Eles são os pilares que sustentam um processo justo, ético e confiável. Mesmo com (na verdade principalmente por conta disso) a crescente complexidade nos ambientes corporativos, a prática desses princípios é uma questão de sobrevivência organizacional.
Que princípios sua organização segue para conduzir investigações? Deixe sua opinião nos comentários!