O habeas corpus é um dos direitos mais essenciais para garantir a liberdade de qualquer pessoa que se veja privada de sua liberdade ou ameaçada de perdê-la.
É um remédio constitucional, previsto na parte de direitos e garantias constitucionais que, portanto, nunca poderá ser suspenso ou diminuído.
Na prática, se traduz na resposta imediata para situações de prisão ou ameaça de prisão que não respeitam os limites da lei. No Brasil, este instrumento ganhou importância prática e, em muitos casos, se tornou uma verdadeira linha de defesa contra prisões arbitrárias, abusos de poder e ilegalidades cometidas por autoridades de todas as esferas.
Mas o que é o Habeas Corpus?
Na prática, o habeas corpus é uma ação autônoma e gratuita e funciona como um pedido de proteção, feito ao Judiciário, para que um indivíduo não perca a sua liberdade. Existem duas modalidades principais: o habeas corpus preventivo, para casos em que há um receio concreto de prisão ilegal; e o habeas corpus liberatório, opropriamente dito, para quando a pessoa já está presa.
Essa ação é ágil e de natureza urgente, destinado a assegurar o direito fundamental de liberdade e evitar ou cancelar prisões que não estejam de acordo com os requisitos legais.
E quando posso ingressar com habeas corpus?
Para que seja possível impetrar um habeas corpus, é necessário atender a duas condições: a) que exista algum ato lesivo à liberdade de locomoção; b) que esse ato tenha origem em ilegalidade ou abuso de poder. E só.
Abaixo, falando na prática, as causas mais comuns de HC são:
- Prisão ilegal ou arbitrária: quando alguém é detido sem que haja justa causa, sem flagrante, delito ou sem o devido processo legal.
- Abuso de autoridade: prisões motivadas por abuso de poder, em que a autoridade usa a prisão como meio de pressão ou coerção indevida.
- Excesso de prazo na prisão preventiva: quando o tempo de prisão preventiva ultrapassa os limites razoáveis, sem justificativa de continuidade ou necessidade.
- Ameaça de prisão ilegal: utilização do habeas corpus preventivo para evitar uma prisão iminente, considerada ilegal ou abusiva.
- Erro processual: quando há falhas processuais graves que comprometem a legalidade da prisão, como mandados de prisão expedidos de forma inadequada ou baseados em provas frágeis ou ilegais.
- Incompetência da autoridade coatora: se a autoridade que ordenou a prisão não tinha competência legal para fazê-lo, o habeas corpus pode ser impetrado para revogar a ordem.
- Falta de justificativa para prisão preventiva: se a prisão preventiva é decretada sem os requisitos legais necessários.
- Medidas cautelares desproporcionais: quando são impostas medidas cautelares restritivas que, embora não sejam uma prisão formal, limitam injustificadamente a liberdade do indivíduo, como o monitoramento eletrônico excessivo ou restrições desnecessárias de deslocamento.
- Descumprimento de regras de progressão de regime: em casos que o detento tem direito à progressão de regime e a autoridade responsável injustificadamente retarda ou impede esse benefício.
- Recusa em conceder liberdade provisória quando devida: situações em que o indivíduo tem direito à liberdade provisória, mas essa liberdade é indevidamente negada.
- Prolongamento indevido de prisão para garantir colaboração ou delação: quando a prisão é estendida para forçar colaboração ou obtenção de delação premiada, violando a voluntariedade dessa colaboração.
O pedido será sempre formulado a quem teria competência para analisar as decisão decorrentes daquela autoridade que está atuando: se for contra ato do Delegado de Polícia, ao órgão do Poder Judiciário que está atuando no caso; se for contra ato do Juiz, ao desembargador; Se for contra ato do desembargador, ao Ministro do STJ ou STJ; e for contra ato do Ministro do STJ, ao STF e se for contra ato do Ministro do STF, ao Presidente do Tribunal ou ao plenário da corte, conforme regulamento interno do órgão. Isso em linhas gerais.
Há outras? Sim, há. Mas essas são as mais comuns.
O papel do advogado especialista no habeas corpus
É possível ingressar com habeas corpus (HC) sem advogado? Sim, é! Inclusive um HC pode ser impetrado sem sequer a possível beneficiada (no HC é chamada de paciente) pela ação ter ciência da ação. Não há limites. Na verdade, há apenas 1 limite: a autoridade coatora não pode impetrar HC contra ato por ela mesma praticado. Seria um contrassenso.
Mas… sim, tem um “mas”, apesar de qualquer pessoa poder fazer isso sem precisar de um advogado, um advogado especialista em direito penal pode fazer uma diferença significativa. A complexidade dos argumentos, a estratégia jurídica e o conhecimento das nuances processuais são cruciais para um recurso dessa monta efetivo.
Um advogado experiente saberá identificar pontos críticos, analisar a coleta de provas, a fundamentação da determinação de prisão, elaborar uma petição clara e objetiva e escolher as melhores referências jurídicas para aumentar as chances de sucesso.
O HC exige muito mais do que simplesmente formular um pedido: requer uma análise cuidadosa da legalidade dos atos praticados e a articulação precisa dos argumentos, atacando os pontos necessários para que o Poder Judiciário veja a ilegalidade do decreto prisional.
Assim, embora não seja obrigatório ter um advogado, é altamente recomendável que um advogado especialista atue para que os direitos do indivíduo sejam plenamente garantidos. Afinal, como se diz popularmente: “é só a sua liberdade que está em jogo”
Uma experiência prática
Agora, permita-me compartilhar uma experiência pessoal que ilustra bem a importância da atuação estratégica no sistema de justiça e que transcendeu até mesmo a figura importante do habeas corpus.
Certa vez, no ano de 2004, quando ainda atuava como delegado da Polícia Federal em Boa Vista/RR, prendi em flagrante delito uma pessoa idosa e cadeirante. Seu crime: ter no seu depósito cervejas estrangeiras para vender em seu modesto bar naquela cidade. A lei determinava a prisão e eu não tinha o poder de determinar a liberdade com fiança: isso cabia somente ao juiz. As circunstâncias me fizeram questionar a proporcionalidade da medida.
Pois bem, em vez de seguir apenas o caminho formal, optei por ligar diretamente para o juiz competente e explicar a situação. Ele determinou, de imediato, a liberdade provisória sem fiança daquela pessoa que estava presa e isso ocorreu antes mesmo de eu concluir todos os procedimentos legais do auto de prisão em flagrante.
Esse diálogo direto poupou tempo e recursos além de ter evitado um constrangimento desnecessário para aquela pessoa envolvida em razão específica de sua situação de saúde. Ah, a cerveja foi devidamente apreendida e encaminhada à receita Federal para os trâmites próprios, na forma da lei. Todo o procedimento foi conforme a lei, até mesmo porque a lei determina que a autoridade policial comunique, de imediato, à autoridade judicial as prisões em flagrante.
Nesse caso, a autoridade coatora, que seria eu mesmo, poderia impetrar um HC em favor do idoso e cadeirante preso? Fica a reflexão…
A importância do habeas corpus na prática atual
O Brasil vive uma fase em que o direito de defesa é constantemente posto à prova.
Já foram mais frequentes, mas ainda vivemos num contexto de operações policiais, aumento de investigações e tensões entre segurança pública e direitos individuais. Dessa forma, o habeas corpus se consolida como um dos principais meios de controle da legalidade dos atos estatais.
O papel do advogado, nesse cenário, é ainda mais relevante: ele não só defende o cliente, mas também contribui para o equilíbrio entre justiça e liberdade. Como sempre digo: um dos papeis do advogado criminal é garantir que não haja abuso por parte do poder estatal.
Exemplos práticos: situações em que o HC é essencial
- Abuso de autoridade: em situações em que a prisão é utilizada como forma de coerção, sem base jurídica suficiente.
- Prisões arbitrárias: casos em que o indivíduo é preso sem flagrante ou sem provas suficientes de que teria cometido um crime.
- Ameaça de prisão preventiva sem fundamentação: quando há uma ordem de prisão preventiva sem justificativa real, apenas para pressionar o investigado.
Esses exemplos mostram que o habeas corpus não é apenas uma formalidade jurídica; mas sim uma proteção ativa contra abusos que colocam a liberdade individual em risco.
É fundamental na defesa da liberdade. E o papel do advogado é vital para que o HC cumpra sua função e ofereça a proteção necessária contra ações ilegais. Embora não seja obrigatório contar com um advogado, a presença de um profissional experiente aumenta as chances de um deferimento dessa medida constitucional.