Incoerência, IA e a Liberdade de Errar

Por: Dercio Carvalhêda 2 de julho de 2025

Por que ainda precisamos de gente de carne e osso nas decisões

A inteligência artificial nunca vai ser incoerente.
Mas não é porque ficou “mais inteligente”. É porque nunca foi coerente para começo de conversa.

Coerência pede consciência.
Consciência leva à escolha.
Escolha exige liberdade.
E liberdade, meu amigo, não cabe em algoritmo.

Até onde a lógica alcança, nenhuma IA tem liberdade. Ela não hesita, não fraqueja, não se arrepende.
Faz o que mandam. E rápido, limpo, sem culpas no travesseiro.

Programs are entirely syntactical; minds have a semantics.”
— John Searle, 1980

A síntese de Searle é clara: a IA reorganiza símbolos, mas não entende o que eles significam. Nem mesmo as que que usam processamento de linguagem neural.

A linguagem neural reorganiza palavras com base em padrões.
O cérebro humano interpreta sentidos com base em vivência.

A IA prevê.
O humano compreende.

A IA acerta frases.
O humano assume significados.

Parece sofisticado, mas é só processamento como quem lê uma frase em mandarim, sem entender nenhuma palavra, apenas reconhecendo padrões.

Um humano trancado em uma sala recebe símbolos em chinês, sem saber chinês. Ele tem um livro com regras sobre como responder com outros símbolos.
Para quem está do lado de fora, parece que ele entende chinês.
Mas ele só está manipulando símbolos.
(Experimento do quarto chinês proposto por Searle)

O pensamento humano, por outro lado, não opera só com símbolos. Ele navega por significados, memórias, contextos, intenções, afetos.

Uma palavra para a máquina é um código.
Para a gente, é uma escolha, um risco, uma possibilidade de impacto real.

É por isso que o humano interpreta, enquanto a IA apenas executa, usando estatística.

A tentação da perfeição automática

Viramos devotos da decisão perfeita: sem contradições, com planilha e KPI para tudo.
Entra a IA, a salvadora que não cansa, não perde fé, não se enerva na hora H.

Só que ela também não sente o peso da consequência.
Planilha não arca com as consequências, quem paga é quem assinou embaixo.

Delegar dilema a quem não sabe o que é valor é terceirizar a própria humanidade da escolha. Simples assim.

Coerência é outra história

Coerência não é rigidez robótica.
É alinhar o discurso, a prática e o que você aguenta sustentar quando o ventilador liga.
É o único traço moral que não derrete quando muda o cenário.

IA nunca será incoerente – não por virtude, mas por limite.
Só faz o que foi programada para fazer. E ponto.

A computer cannot be creative or make sense of a situation in a human way.”
— Hubert Dreyfus

Errar é humano e prova de liberdade

Nossa incoerência é chata de admitir, mas é sinal de que ainda estamos no comando.
Voltar atrás? Podemos.
Pedir desculpas? Dá para fazer.
Mudar de ideia sem perder a alma? Também.
Até errar de propósito – por coragem ou teimosia.

A IA não.
Ela nunca vai hesitar por empatia nem acertar por bravura.
Ela joga seguro. E só.

Diagnóstico Ético Aplicado™ – lógica para quem realmente decide

Foi por isso que criei o Diagnóstico Ético Aplicado™.
Não é para botar piloto automático em dilema.
É para iluminar a coerência (ou a falta dela) que ninguém enxerga no Excel.

Ele não rouba o arbítrio, ele esclarece.
Entrega estrutura, clareza, lógica.
E deixa o peso da decisão onde sempre esteve: nos ombros de quem escolhe.

Usa matemática? Usa.
E a IA? Também usa.
Tem fórmula? Sim, e complexa.
Tira subjetividade da escolha? Não, mas:

  • Mostra o caminho estruturado.
  • Apresenta possibilidade de soluções.
  • Justifica, de forma lógica, cada uma das soluções apresentadas.
  • Gradua, em classificação, as decisões de acordo com os princípios que a organização ou você mesmo defende.

E a escolha da solução é sua. Assim como as consequências. Mas, por outro lado, não estará mais no escuro. Se for incoerente é porque assim decidiu — e tudo bem — o diagnóstico não julga. E as vezes, o que na matemática se parece incoerência, é na verdade a intuição humana mostrando o melhor caminho.
Mas só as vezes…

Talvez, no fim, a incoerência seja o último sinal vital da nossa humanidade.
A IA é eficiente, precisa, implacável.
Mas só o ser humano pode se contradizer e, mesmo assim, recuperar a própria integridade.

Só o ser humano tem a intuição de ir contra a lógica e, mesmo assim, estar certo.

Você ainda quer decidir no feeling ou decidir com lógica? Liberdade você já tem; estrutura, agora também.

Publicado em: 2 de julho de 2025 por