A composição de muitos conselhos ainda se baseia em títulos e reputações individuais. Mas governança é um jogo coletivo e exige mais do que nomes fortes. Sem equilíbrio entre perfis estratégicos, o risco de colapso é real.
Em resumo: ter uma visão do todo, aplicando as devidas habilidades e especialidades, com uma visão integrada do negócio.
Em 2024, a fusão entre @Arezzo&Co e @Grupo Soma desmoronou após disputas societárias e falhas claras de alinhamento estratégico — um exemplo real do que acontece quando a governança não integra visões e competências. Veja o caso aqui.
1. O erro comum na formação de conselhos
Muitas empresas, ao estruturar seus conselhos, focam quase exclusivamente em currículos impressionantes e especializações técnicas de ponta. A lógica parece simples: quanto mais expertise acumulada, melhor será o conselho.
Seria lógico se não fosse incompleto.
O erro está em esquecer que governança é atividade coletiva. Estratégia, risco, sucessão e inovação não se resolvem por decisões isoladas. É necessária a integração. Todas essas especialidades e a visão do todo, precisam conversar.
É aí que entram os necessários Nexialistas, também chamados de integradores.
Especialistas constroem paredes sólidas. Generalistas enxergam o terreno todo. Nexialistas constroem pontes que ligam tudo isso em uma direção só.
Grandes organizações não se fazem apenas de grandes especialistas. Fazem-se de sistemas vivos, conectados, com visão e integração.
E em tempos de ESG, transformação digital, diversidade e sucessão, esse equilíbrio se torna ainda mais crítico. A ausência de um desses perfis no conselho expõe a organização ao risco de decisões mal ancoradas, desarticuladas ou desconectadas da realidade.
É por isso que conselhos de alto desempenho precisam de algo além de títulos: precisam de composição intencional.
2. A tríade essencial: Generalistas, Especialistas e Nexialistas
Para que um conselho funcione de forma estratégica e resiliente, ele precisa reunir três perfis fundamentais:
- Generalistas
- Especialistas
- Nexialistas
Pense como em uma batalha: Cada soldado cumpre uma função que o outro não substitui.
Generalistas planejam a guerra, enxergando o todo: terreno, inimigos e recursos.
Especialistas dominam habilidades específicas para dominar o campo.
Nexialistas coordenam os especialistas, adaptam o plano e lideram a integração.
3. As características de cada elemento da tríade
Generalistas:
- Pensam de forma ampla e conectam múltiplas disciplinas.
- Antecipam cenários com visão sistêmica e estratégica.
- Transitam com naturalidade entre áreas diferentes, mesmo sem dominar cada técnica.
- Transformam complexidade em direção — mesmo com pouca profundidade técnica.
Especialistas:
- São referência técnica no que fazem.
- Mergulham nos detalhes com precisão e consistência.
- Antecipam riscos e propõem soluções robustas.
- Sua autoridade vem da profundidade, não da amplitude.
Nexialistas:
- Fazem áreas distintas se entenderem — e colaborarem.
- Traduzem linguagens técnicas em decisões acessíveis.
- Lideram com escuta, mediação e construção de sentido comum.
- São o elo vivo entre estratégia, operação e cultura.
Para deixar clara a diferença entre generalistas e Nexialistas:
O generalista é quem entende o mapa inteiro — ele conecta pontos, analisa cenários e antecipa caminhos. Já o nexialista não apenas entende o mapa: ele caminha entre as trilhas, conecta viajantes, traduz sinais e garante que todos cheguem juntos ao destino. Um articula a visão ampla; o outro transforma essa visão em alinhamento real entre diferentes áreas e pessoas.
Se a organização fosse uma torre de Babel, o generalista olharia de cima e entenderia as línguas. O nexialista, por outro lado, desceria até o chão — e faria todos se entenderem.
Papel | Atua sobre… | Domina… | Força central |
Generalista | Contextos e cenários | A lógica ampla entre áreas | Visão estratégica transversal |
Especialista | Um campo específico | A técnica, o método, o detalhe | Precisão e autoridade técnica |
Nexialista | Relações entre áreas | A linguagem e a escuta ativa | Integração e mediação |
4. Por que um conselho não pode ter só especialistas, só generalistas ou só nexialistas
Conselhos eficazes exigem a presença equilibrada dos três perfis.
A ausência de qualquer um deles compromete a eficiência estratégica:
- Só especialistas:
Produzem profundidade, mas perdem o todo. A visão fica fragmentada, o debate se torna técnico demais e a estratégia se dilui na execução. - Só generalistas:
Enxergam o cenário, mas não sustentam os pilares. Sem profundidade técnica, correm risco de superficialidade e decisões com baixa sustentação. - Só nexialistas:
Integram com maestria, mas sem generalistas para alimentar a visão ou especialistas para ancorar tecnicamente, ficam operando conexões vazias.
Um conselho com apenas dois desses três perfis é como uma mesa de três pernas faltando uma: pode se sustentar por um tempo, mas inevitavelmente cede sob pressão.
1. Especialistas + Generalistas (sem Nexialistas)
O que se tem:
✔ Profundidade técnica para avaliar riscos e oportunidades com precisão.
✔ Visão ampla e estratégica para antecipar cenários e conectar áreas.
O que falta:
✘ Tradução entre os dois mundos.
✘ Integração real entre técnica e estratégia — cada um fala sua língua.
✘ Mediação de conflitos ou ruídos operacionais.
Risco principal: decisões ficam travadas por falta de alinhamento entre a visão estratégica e a execução técnica.
2. Generalistas + Nexialistas (sem Especialistas)
O que se tem:
✔ Visão estratégica, articulação entre áreas e fluidez nas discussões.
✔ Comunicação eficiente e ambiente colaborativo.
O que falta:
✘ Base técnica sólida para validar riscos, limites e viabilidades.
✘ Profundidade analítica para decisões críticas em áreas-chave.
✘ Autoridade técnica para sustentar posições diante de pressões externas.
Risco principal: o conselho vira um espaço de boas ideias e integração, mas sem sustentação técnica real — um castelo de cartas.
3. Especialistas + Nexialistas (sem Generalistas)
O que se tem:
✔ Domínio técnico e operacional.
✔ Boa comunicação entre áreas e capacidade de mediação.
O que falta:
✘ Visão do todo, pensamento sistêmico e leitura de cenário.
✘ Capacidade de antecipar o futuro e direcionar o conselho estrategicamente.
✘ Conexão com o contexto externo, mercado e tendências.
Risco principal: o conselho funciona bem para o agora, mas falha em pensar o depois — reage, mas não lidera.
Governança eficiente nasce do equilíbrio — e da interação construtiva entre esses três perfis.
5. Pontos fracos.
Cada um desses perfis também tem seus pontos fracos, claro. Ninguém é perfeito.
Generalista: Falta de profundidade técnica
- Pode subestimar riscos por desconhecer detalhes técnicos.
- Corre risco de parecer “conceitual demais” ou superficial para especialistas.
- Tem dificuldade em sustentar decisões quando confrontado com argumentos técnicos complexos.
- Depende de especialistas para validar ou executar suas ideias.
Especialista: Visão fragmentada e foco excessivo no detalhe
- Pode não enxergar o impacto sistêmico das decisões.
- Costuma defender soluções dentro de sua área, com viés técnico.
- Dificuldade de dialogar com áreas externas ou estratégicas.
- Tendência a valorizar a perfeição técnica em detrimento da agilidade ou do pragmatismo.
Nexialista: Falta de conteúdo próprio (visão ou técnica)
- Atua como elo entre outros, mas não é fonte primária nem de visão estratégica nem de profundidade técnica.
- Se estiver sozinho com outros nexialistas, o diálogo flui, mas sem direção clara nem base sólida.
- Pode ser visto como “político demais” se não houver entregas palpáveis.
- Depende da qualidade dos outros dois perfis para brilhar.
6. Como reconhecer cada perfil
Generalistas:
- Reconhecidos pela curiosidade intelectual e pelas perguntas amplas.
- Buscam entender o impacto de decisões em múltiplas áreas.
Especialistas:
- Reconhecidos pelo domínio técnico sólido e precisão nas análises.
- São referência em temas críticos do negócio.
Nexialistas:
- Reconhecidos pela habilidade de traduzir, integrar e liderar em ambientes complexos.
- Conseguem harmonizar visões distintas em estratégias únicas.
Importante: não existe o “superconselheiro”, o perfeito: cada ser humano tende naturalmente a desenvolver uma dessas competências como predominante.
O que importa é construir conselhos equilibrados — e desenvolver continuamente a integração entre os talentos.
7. Conselhos são como organismos vivos e não museus de currículos
A excelência de um conselho não está na soma dos títulos individuais. Está na capacidade real de construção integrada.
Governança moderna é inteligência coletiva. É diversidade de olhares, profundidade técnica e capacidade de articulação estratégica.
Formar conselhos com generalistas, especialistas e nexialistas é escolher conscientemente o caminho da resiliência, da inovação e da construção de valor sustentável.
Grandes organizações não se constroem apenas com o saber de cada um. Constroem-se com o saber de todos — integrado.
E mais: conselhos não precisam de super-heróis — precisam de pessoas dispostas a expandir suas próprias bordas.
Ser generalista não impede que se desenvolva profundidade técnica. Ser especialista não exclui a escuta integradora.
O futuro da governança está em conselheiros que compreendem seu papel e buscam evoluir continuamente para além dele.